No mês em que se celebra o Dia da
Visibilidade Trans no Brasil (em 29 de janeiro), a discussão acerca da
identidade de gênero se torna uma das principais motivações de um movimento
que tem como propósito trazer conhecimento e visibilidade à pauta que permeia
a vida de pessoas transsexuais e travestis - parte da comunidade LGBTQIA+ que
mais morre em decorrência de transfobia de acordo com um Dossiê dos
Assassinatos e da Violência Contra Pessoas Trans Brasileiras, divulgado em
2020 pela Associação Nacional de Travestis e Transexuais (Antra). Você já
parou para pensar se essas pessoas estão inseridas no mercado de trabalho, ou
se as empresas preparam seus funcionários de uma forma adequada para receber
pessoas trans e travestis?
Provando que são capazes de ir além
do que o imaginário social propõe e impõe, transsexuais e travestis como Lea
T (Modelo), Laerte (Artista), Liniker (Cantora), Linn da Quebrada (Artista) e
Valentina Saluzz (Diretora Executiva) - são de grande importância para a
desmistificação de estereótipos nos tempos atuais. Além de terem influência
na construção de um novo projeto de mundo, também são referências para uma
geração, principalmente como profissionais.
Para Valentina, que dirige a
agência de comunicação Nexxt, em Paris, não é só necessário capacitar pessoas
cisgêneras para lidarem com vidas trans, mas também é de fundamental
importância que se dê a atenção necessária em capacitar pessoas trans para se
inserirem adequadamente no mercado de trabalho, só assim elas realmente terão
mais oportunidades e possibilidades.
"A importância de capacitar
pessoas trans é a mesma para capacitar qualquer outra pessoa. Precisamos de
médicos, juízes, engenheiros, cientistas... não há motivos para exclusão e
transfobia. Já está mais do que na hora de ocuparmos espaços e cargos que
nunca nos foram oferecidos antes", salienta.
Vale ressaltar que devido ao longo
contexto histórico de marginalização no qual transexuais e travestis foram
submetidas, se firmar no mercado de trabalho se tornou um processo árduo e
doloroso, devido aos inúmeros obstáculos enfrentados no decorrer de suas
vidas, tendo que lidar desde cedo com a rejeição, principalmente no início de
seus processos de transição. "Quando são expulsos de casa, não conseguem
se dedicar aos estudos, e quando são aceitos no mercado de trabalho, não lhes
é oferecido um plano de carreira, sendo essa falta de aceitação o motivo para
que muitas acabem recorrendo a prostituição", completa Saluzz.
A psicóloga Clara Sym (30), formada
pela Universidade Federal Fluminense (UFF), ressaltou a importância de as
empresas treinarem suas equipes para lidar com pessoas trans e com toda a
diversidade das identidades de gênero. "Me parece importante questionar
como a educação habitualmente escolarizada, ponto de partida para o futuro
ingresso no mercado de trabalho, há tempos está voltada para a manutenção de
uma lógica cultural individualista à serviço do ego, e comparativa em função
da competição (que se propõe meritocrática, dentro da distorção que só confere
mérito à quem se aliena das desigualdades que desumanizam vidas humanas). O
que se forma aí são corpos desconectados de si e de suas
experiências/potências singulares, em prol de reproduções normativas que
pretendem garantir legitimidade de existência, e aceitação social",
ressalta Sym.
"O que se produz são
subjetividades padronizadas, condicionadas às construções reducionistas a
respeito do que seriam homens e mulheres 'normais' [...] É violenta a
repressão das singularidades, alteridades e multiplicidades de ser. Diante
dessas considerações, digo que a importância das empresas educarem suas
equipes para receberem pessoas trans e toda diversidade extensa das
identidades de gênero, tem a ver com ampliar a tomada de responsabilidade
pelo compromisso com a construção de outras versões de mundo. Versões em que
modos autênticos de expressão não sejam excluídos, deslegitimados,
desqualificados ou assassinados (em todos esses casos violentados), mas sejam
respeitados, desejados e celebrados, pelo direito de trabalhar partindo das
competências envolvidas em ser quem se é e quem se quer ser",
conclui.
Estigmas ligados à transexualidade
no Brasil ainda são expressivamente altos dentro do cenário social, tal qual
colocou o país no 68º lugar do ranking de países mais seguros para a
população LGBTQIA+, como divulgado no ano de 2020 pela Antra. Sendo este, o
lugar que mais mata travestis e transexuais no mundo.
De acordo com dados do Instituto
Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), a expectativa de vida das
pessoas trans é de 35 anos - menos da metade da média nacional, que é de 75
anos. São questões como estas que levam a pauta sobre a pluralidade das identidades
de gênero mais necessária do que se pode imaginar. Além das dificuldades de
terem acesso básico à saúde, um dos principais fatores de adoecimento dessas
pessoas é a transfobia, que impede a simples chegada de suas respectivas
velhices.
Fonte: Nexxt
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