Maria Raquel de Souza Membro do projeto Mães da Favela da Central Única das Favelas (Cufa)
No Brasil, a Covid-19 chega através da classe média e privilegiada, mas é na favela que tem seus piores efeitos revelados. É diante da desigualdade social que se naturalizou no País que a pandemia deixa mais claro a exclusão socioeconômica.
Em uma sociedade formada a partir de uma herança escravocrata, de um racismo estrutural que subjuga as classes periféricas, a Covid-19 toma proporções mais profundas, para além da saúde pública. Ficar em casa é um desafio para as mães chefes de famílias, que sustentam as atividades essenciais, para o funcionamento da engrenagem econômica, e são também invisíveis durante todo o período de quarentena. Enquanto para uns é apenas uma reorganização de rotina, para a mãe na favela, significa o medo de não ter o alimento na mesa.
Num contexto de desamparo, não possuem ao menos o direito ao isolamento social, consequência de uma série de violações de garantias fundamentais à dignidade humana. Isso escancara a perversidade que é a falta de investimentos em políticas públicas e a má distribuição de renda nas favelas por todo o País.
Diante disso, a Cufa (Central Única das Favelas), lançou no início do isolamento o programa Mães das Favelas, consistindo num auxílio de 120 reais por dois meses no vale alimentação. Para que sejam beneficiadas, foi formada junta as lideranças uma grande rede de solidariedade por diversas favelas do Brasil e do Ceará. Um trabalho que torna possível que a ajuda chegue nas mãos de quem está sentindo na pele as consequências econômicas da quarentena. A favela não está sozinha! Essa é a voz das mães que nos repetem com a alegria o benefício lhes dado. Esse é o combustível que move todas as ações realizadas, como doações de cestas básicas, material de higiene, álcool em gel, máscaras e gás de cozinha.
A Covid-19 mostrou que são necessários muitos avanços na distribuição de renda e, ainda na mudança da mentalidade brasileira que vive num passado de exploração, numa escravidão modernizada em que a senzala é a favela. Sabemos que a conta será paga pelos mais pobres, porém estamos na linha de frente, trabalhando incansavelmente para chegar onde há invisibilidade, para que as mães das favelas possam acreditar em dias melhores.
Por Maria Raquel de Souza
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